Projeto de Lei que afrouxa o licenciamento ambiental no país segue tramitando no Congresso

Entenda o que é o Licenciamento Ambiental, como ele funciona hoje e as principais mudanças propostas pelo projeto de lei que quer desmontá-lo no Congresso

A bancada ruralista da Câmara dos Deputados continua se articulando para desmontar o sistema de licenciamento ambiental no país. Sua justificativa é de que são necessárias medidas que simplifiquem a concessão de licenças, reduzindo os prazos para que os órgãos de fiscalização decidam sobre a viabilidade ambiental de projetos agrícolas e empreendimentos de infraestrutura. No entanto, para ambientalistas, o licenciamento mais permissivo representará um retrocesso que coloca em risco a sociedade e o meio ambiente.

Apesar de estar há 14 anos no Congresso Nacional, o Projeto de Lei 3729/2004 tramita atualmente em regime de urgência, ou seja, quando há dispensa de exigências regimentais para sua aprovação (como a análise pelas Comissões). Nesse caso, sua tramitação pode ir direto para votação no plenário.

Veja abaixo o que muda caso o projeto seja aprovado, conheça outras ameaças ao licenciamento ambiental em tramitação no Congresso e entenda como ele funciona hoje. Também mostramos como você pode atuar para pressionar os congressistas em favor das posições em que você acredita.

 

Principais mudanças propostas pelo projeto de lei 3729

Flexibilização das exigências ambientais: Se aprovada, permitirá que estados e municípios decidam sobre o potencial poluidor ou degradador de cada empreendimento. Atualmente, estes critérios devem seguir as decisões do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), podendo ser mais exigentes, mas nunca menos rigorosos que as exigências determinadas pelas normas federais. Os ambientalistas alegam que, ao repassar a prefeitos e governadores a possibilidade de fazer suas próprias regras de licenciamento, o projeto levaria o país a uma verdadeira “guerra ambiental”, com o desmonte de regras para atrair empreendimentos. Ou seja, os estados e munícipios mais permissivos ao desmatamento e às violações dos direitos da populações potencialmente atingidas estariam mais propensos a receber investimentos, podendo inclusive retirar a obrigatoriedade de consulta pública às populações interessadas.

 Concessão de licenças, independentemente da manifestação dos demais órgãos da administração pública: Para o Ministério Público Federal, esse é um dos pontos mais controversos, pois o projeto retira da Fundação Nacional do Índio (Funai), da Fundação Cultural Palmares, dos órgãos gestores de unidades de conservação, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) o poder de veto sobre o licenciamento. Desse modo, por exemplo, estes órgãos não poderiam proibir empreendimentos que degradem excessivamente as zonas de amortecimento de Unidades de Conservação (UC). Além disso, o órgão licenciador poderá desconsiderar as medidas sugeridas por estes órgãos para prevenir, mitigar e compensar impactos sobre UCs, povos tradicionais e opatrimônio histórico.

– Dispensa de licenciamento e “auto licenciamento”: Se for aprovado como está, atividades como pecuária extensiva, silvicultura, agroindústria de menor porte e empreendimentos rodoviários (que são um dos principais vetores do desmatamento na Amazônia) não precisariam mais de licenciamento ambiental. Para alguns casos, a depender dos impactos e características ambientais da área de implantação do empreendimento, cria-se a figura do “auto licenciamento. Este é baseado unicamente em declarações do empreendedor e nas medidas condicionantes previamente estabelecidas pelo órgão ambiental responsável, independentemente do potencial poluidor do empreendimento e da relevância ecológica e social da área.

– Limita a participação popular: O projeto também retira a prerrogativa do Ministério Público, dos cidadãos e das entidades civis de requisitarem a realização de audiências públicas para debater os estudos ambientais dos empreendimentos em licenciamento. Ministério Público e cidadãos poderiam apenas requerer a realização de consultas eletrônicas.

Prazos de avaliação mais curtos: Já este item estabelece prazos e limites para que os órgãos ligados ao licenciamento se manifestem. Por exemplo, no caso em que o empreendimento exigir Estudo de Impacto Ambiental, uma licença prévia deverá ser concedida ou não em no máximo dez meses. Hoje, o tempo consumido pelo trâmite de licenciamento é muito variável e depende da complexidade do empreendimento. Projetos de grande vulto podem se alongar por anos e as licenças têm prazo de validade.

Para acessar a íntegra do projeto de lei 3729, que inclui a justificativa de congressistas que pedem sua aprovação, clique aqui.

 

Regime de Urgência

Em março de 2018, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (MDB), chegou a afirmar que o projeto de lei 3729/2004 seria votado no plenário. A proposta está no congresso há 14 anos, sendo que, nesse período, dezoito projetos que tratam do mesmo tema foram anexados a ele. Com o apoio da bancada ruralista, a proposta tramita em regime de urgência desde o ano passado.

Na ocasião, mais de 100 entidades ligadas à defesa do meio-ambiente, – como WWF, Greenpeace, SOS Mata Atlântica, Instituto Socioambiental (ISA) e Associação dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) -, assinaram um documento manifestando posição contrária a aprovação do PL 3729 (veja no link) e desmentindo um suposto acordo entre ambientalistas e ruralistas anunciado por Maia. O PL não foi votado, mas continua tramitando na Câmara dos Deputados e pode ser votado em regime de urgência até o fim do ano, quando termina a atual legislatura.

Segundo Rafael Giovanelli, advogado do Programa de Políticas Públicas do WWF-Brasil, o problema que ocorre atualmente no licenciamento ambiental é muito mais de ordem administrativa, com os órgãos públicos tendo poucos funcionários e recursos para realizar o processo, do que de ordem legislativa.

“O licenciamento certamente é um entrave para os projeto desprovidos de viabilidade ambiental. Eles devem ser adequados caso queiram ser implantados, o que pode levar tempo. Mas, nesses casos, ser um entrave significa que a legislação está funcionando bem. O problema surge quando interesses políticos de ocasião decidem que tais projetos serão implantados a fórceps. A Usina de Belo Monte é o mais claro exemplo disso”, disse ao Lei.A.

 

Outras ameaças tramitam no Congresso

Enquanto a bancada ruralista não consegue aprovar lei que desmantela todo o licenciamento ambiental, há movimentos na direção de desconstrui-lo gradativamente. No dia 09/05, foi colocado para votação no plenário do Senado o Projeto de Lei 447/2012, que veda a suspensão ou cancelamento de obras irregulares já iniciadas.

Além de impor grave retrocesso ao licenciamento ambiental, o projeto viola diretamente as funções da Justiça, do Ministério Público e dos órgãos ambientais. O Instituto Socioambiental e Ministério Público Federal elaboraram notas técnicas em que apontam irregularidades no PL. Segundo o MPF, a proposta apresenta grave inconstitucionalidade por limitar o poder de controle da administração pública e destaca a exigência de licenciamento ambiental como condição para a execução de obras públicas, conforme o disposto na Constituição Federal (leia a nota: link).

 

Você pode atuar

Quer influenciar na decisão dos deputados? Algumas opções são as seguintes:

– Mande seu recado diretamente para o presidente da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia (MDB). É dele a prerrogativa de colocar ou não o Projeto de Lei 3729/2004 para votação. O e-mail é dep.rodrigomaia@camara.leg.br e o telefone do gabinete é (61) 3215-5308.

– Mande também sua mensagem para o Senador paranaense Acir Marcos Gurgacz, pois é dele o Projeto de Lei 447/2012, que veda a suspensão ou cancelamento de obras irregulares já iniciadas. O e-mail é acir@senador.leg.br e o telefone do gabinete é (61) 3303-3131.

 

 

 

O licenciamento ambiental é um instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente. É ele que concede ou nega, por exemplo, a possibilidade de uma empresa se utilizar de áreas, gerando impactos ambientais e sociais. Nesse sentido, o licenciamento é um conjunto de regras que promove proteção ao meio ambiente para não haver prejuízo aos recursos naturais e à qualidade de vida da população.

Na prática, ele é a busca pelo equilíbrio entre atividades econômicas e de conservação do meio ambiente. Por meio do licenciamento, técnicos da área ambiental podem avaliar e prevenir os impactos causados pelos diversos tipos de atividades, medindo, controlando suas consequências e exigindo mitigações e compensações. De grandes barragens de rejeitos a empreendimentos agropecuários, passando pela construção de casas e rodovias, tudo precisa ter seu impacto avaliado para que a sociedade não fique prejudicada em função de interesses econômicos individuais.

Por meio do licenciamento ambiental, setores importantes da economia, como energia elétrica, construção civil, agronegócio e mineração, têm sua atuação regida por autorizações que envolvem o bem comum e o conhecimento científico. E o licenciamento lida ainda com preservação do patrimônio histórico, espeleologia e arqueologia, gestão do uso do solo, planejamento urbano e respeito às populações tradicionais. Assim, ele é também importante na solução de conflitos que possam surgir com grandes empreendimentos.

 

 

 

Qualquer pessoa ou empresa que empreender uma atividade potencialmente poluidora deverá solicitar o licenciamento ambiental. Atualmente a lei mais importante que trata do tema no país é a 6938/1981, que criou a Política Nacional do Meio Ambiente e estipula a obrigação do licenciamento. Ela deu origem ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).

O Conama tem, entre suas competências, estabelecer “normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras”. Assim, ele determinou critérios para estudos de impacto ambiental e atividades que devem se submeter ao processo (Resolução 001/1986) e, posteriormente, os critérios para o licenciamento ambiental (Resolução 237/97).

O tamanho e alcance da obra geralmente determina se o licenciamento será feito pela prefeitura, pelo estado ou por órgão federal. Porém, todos eles devem executar as determinações do Conama que garantem níveis mínimos de proteção ambiental em todo o país. Se uma obra atinge grupos indígenas ou o patrimônio histórico, conforme legislação atual, é necessário que tenha autorização dos órgãos ligados a essas áreas.

Se um empreendimento não realizar o licenciamento, pode ser penalizado dentro da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), com punições que vão de multas à prisão dos responsáveis. As penas podem chegar a seis anos de prisão para quem fornece estudo em relatório total, ou parcialmente, falso ou enganoso.

 

 

 

Entre os procedimentos listados pelo Conama, está um que afirma que as atividades econômicas com potencial para causar maior impacto, como as hidrelétricas, barragens de resíduos e instalação de usinas, devem realizar o licenciamento em três fases:

1) Licença Prévia (LP): a empresa deve apresentar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da obra ao poder público (órgão licenciador), que define se a atividade proposta para aquela localidade é viável ou não, estabelecendo condições e exigências preliminares para o seu planejamento, em caso se viabilidade ambiental.

2) Licença de Instalação (LI): o poder público analisa se os ajustes estabelecidos na licença prévia foram realizados e autoriza o início da obra.

3) Licença de Operação (LO): após a construção da obra ser concluída, o poder público analisa se as exigências anteriores foram cumpridas para permitir ou não que o empreendimento inicie sua operação.

Sempre que o órgão licenciador julgar necessário, ou quando houver pedido de entidades civis, do Ministério Público ou de mais de 50 cidadãos, os estudos de avaliação de impacto dos empreendimentos devem ser debatidos com a sociedade por meio de audiências públicas.

 

 

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