Mudança na chamada Lei Robin Hood tramita na Assembleia e, se aprovada, pode provocar o fim da receita repassada aos municípios para manutenção de conselhos patrimoniais, circuitos turísticos e parques municipais
Qual o sentido de acabar com uma lei que levou Minas Gerais a se tornar referência nacional? A quem interessa modificar um sistema moderno de critérios que premia financeiramente a proatividade das cidades que fazem mais por seus cidadãos?
Questões como essas estão mobilizando centenas de cidades e conselhos municipais contra o projeto de lei 4.773/17, que propõe novos critérios para a distribuição do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS). Ele está em tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e, caso seja aprovado, pode penalizar as cidades que mais atuam em áreas como turismo, cultura, esporte, preservação de florestas e conservação da biodiversidade.
Entenda o caso e veja como atuar.
O que é ICMS?
- Imposto gerado toda vez que alguém compra ou vende uma mercadoria ou presta algum serviço nas áreas de comunicação e transporte intermunicipal ou interestadual.
- Pela Constituição de 1988, a cada R$ 100 que o poder público arrecada de ICMS, R$ 75 (75%) pertencem aos Estados e R$ 25 (25%) devem ser repassados aos municípios.
- Desses R$ 25, ainda por lei federal, R$ 18,75 (75% desse valor), no mínimo, voltam para o município onde foram gerados, pois estão atrelados ao chamado Valor Adicional Fiscal (VAF).
- Sobre o quarto restante (25%), ou R$ 6,25, cabe às Assembleias Legislativas definirem quais serão os critérios de repasse aos municípios. A polêmica do projeto de lei está exatamente na mudança das regras para divisão destes 25% em Minas Gerais.
Como é feita a divisão em Minas Gerais?
A distribuição desses R$ 6,25 a cada R$ 100 é regida pela Lei 18.030/2009, originalmente chamada de Lei Robin Hood e depois intitulada ICMS Solidário, pois condiciona o recebimento dessa parte dos recursos do imposto, por parte dos municípios, à realização de atividades e ao cumprimento de 18 critérios nas áreas de meio ambiente (ICMS Ecológico), cultura e patrimônio (ICMS Cultural), esportes (ICMS do Esporte), turismo (ICMS do Turismo), saúde, educação, produção de alimentos e recursos hídricos, entre outras.
A legislação mineira impede a pura distribuição pelos critério do “arrecadou mais, recebe mais” e “é maior, recebe mais”. Ela dá a possibilidade que parte do recurso seja distribuído aos pequenos municípios que forem proativos, ganhando mais por realizar atividades como manter o patrimônio histórico, desenvolver os circuitos de turismo, incentivar a produção de alimentos saudáveis, etc.
No que diz respeito ao critério ambiental, o chamado ICMS Ecológico, a distribuição da cota-parte dos município está pautada no cálculo do Índice de Meio Ambiente (IMA), que recompensa as prefeituras que investem na manutenção de unidades de conservação, estações de tratamento de esgoto, aterros sanitários e usinas de compostagem, entre outras ações. Ou seja, recebem o ICMS Ecológico os municípios que preservam suas florestas e rios, tratando seus resíduos.
Na área de cultura, por exemplo, para receber esses recursos, o município deve manter museus, arquivos e bibliotecas públicas, além de realizar atividades relacionadas à educação patrimonial. A proteção de bens culturais imateriais reconhecidos (como as celebrações de Folia de Reis), a criação de uma lei municipal de patrimônio cultural e de um conselho municipal do patrimônio e a existência de bens culturais tombados, entre outras ações, são também fatores preponderantes para receber o ICMS cultural.
O que muda caso o projeto de lei 4.773/17 seja aprovado?
- A lógica de “dar mais aos municípios que fazem mais pelos cidadãos”, princípio norteador da Lei Robin Hood (ICMS Solidário), deixará de existir caso o projeto de lei, de autoria do deputado Paulo Guedes (PT), seja aprovado na Assembleia Legislativa.
- O princípio da “proatividade” dos atuais 18 critérios será substituído por apenas cinco, praticamente extinguindo os ICMS Cultural, Turístico e o do Esporte.
- O projeto de lei propõe a criação de um critério chamado Compensação para Manutenção do Valor Nominal do Exercício Base que, na prática, congela os recursos recebidos atualmente pelos municípios. Caso o montante do ICMS aumente com o crescimento da economia, este ganho seria redistribuído ao longo do tempo aos municípios que, pelos critérios atuais, recebem hoje um valor menor.
- A simplificação dos critérios de avaliação coloca em risco políticas públicas que que dependem do ICMS Solidário para sobreviver, como os conselhos municipais de patrimonialização, esporte, turismo e desenvolvimento rural sustentável.
O que eles dizem
Pela mudança do ICMS Solidário
Segundo o autor, se aprovada, a nova lei levaria a uma distribuição mais justa e simplificada para a distribuição do ICMS, de forma que os municípios mais pobres, especialmente nas regiões como Norte de Minas e os Vales do Jequitinhonha e Mucuri (suas principais base eleitorais) passem a receber mais recursos.
Pela manutenção do ICMS Solidário
“Por meio do ICMS Cultural, Minas Gerais é único Estado no Brasil que apresenta uma proposta municipalista de defesa do patrimônio cultural e de salvaguarda dos bens patrimoniais”, comentou. Para o secretário, graças à Lei Robin Hood, muito da cultura mineira tem sido conservada, restaurada, revitalizada e adequadamente utilizada pelas comunidades.
Pressão faz efeito
Diversos conselhos municipais de Turismo, Cultura e Patrimônio se declararam contrários ao projeto de lei e pedem a manutenção da Lei Robin Hood. Afirmam que a nova proposta irá desestimular os municípios pequenos que se esforçam para desenvolver ações e programas a partir dos 18 critérios de proatividade municipal.
Durante audiência pública realizada na Assembleia Legislativa no último dia 13 de março, pressionado por entidades da Cultura e do Turismo, o deputado Paulo Guedes afirmou que está disposto a rever algumas de suas proposições. “Estou convencido de que esses dois critérios (ICMS Cultural e ICMS Turístico) precisam ser mantidos”, disse.
E você, o que acha disso? Veja o que fazer
- CONHEÇA E MOBILIZE! Procure saber se sua cidade possui conselhos municipais e se eles estão na luta pela manutenção do ICMS Solidário. Mobilize!
- AJA! Mande um e-mail para o deputado Paulo Guedes (PT), autor da proposta (dep.paulo.guedes@almg.gov.br), manifestando sua opinião. Ou fale com o deputado Leonídio Bouças (dep.leonidio.boucas@almg.gov.br), presidente da Comissão de Constituição e Justiça, que atualmente analisa o projeto de lei.
- MONITORE E AJA! As comissões de Desenvolvimento Econômico e Administração Pública também irão analisar o projeto de lei 4.773/17. Se receber parecer favorável dessas comissões, ele será votado em primeiro turno pelo plenário da Assembleia Legislativa. Se receber emendas, o projeto voltará à análise das comissões, antes de ser votado em segundo turno e seguir para redação final. Você também pode cobrar os deputados dessas comissões.
1 Comment
Pra que modificar uma coisa que funciona bem? Sou contra qualquer mudança.