Políticas, nacional e mineira, voltadas a modernizar a legislação sobre a geração
e destinação correta do lixo continuam ineficazes
O Lei.A analisou 32 projetos de lei sobre disposição, tratamento e reciclagem de
lixo em Minas: o resultado é decepcionante
Falta de foco e de vontade política emperram pauta dos “resíduos sólidos”
na Assembleia Legislativa
Sabe aquela história de leis que não “pegam” no Brasil? A Política Nacional de Resíduos Sólidos, aprovada em 2010, é uma delas. Passados nove anos, nenhuma meta pactuada avançou. A tão sonhada articulação entre União, estados, municípios e setor privado para resolver gradativamente o problema do excesso de geração, o não-reaproveitamento e a destinação inadequada do lixo, jamais aconteceu.
O exemplo mais evidente é a meta emblemática daquela política: “lixão zero” nas cidades brasileiras até 2014. Já estamos em 2019 e ainda existem três mil lixões ativos no país. Enquanto isso, as montanhas de lixo se acumulam.
Clique aqui e conheça a lei da Politica Nacional de Resíduos Sólidos
Em abril desse ano, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, anunciou o lançamento do Programa “Lixão Zero”, cujo foco é regulamentar o aproveitamento energético a partir da incineração do lixo. A iniciativa tem seus defensores, mas também deve esbarrar no mesmo problema que vem desde 2010, na Política Nacional dos Resíduos Sólidos: a desarticulação institucional.
Municípios alegam que não conseguem se adequar à lei pois os recursos disponibilizados pelo governo federal são insuficientes. Já os estados reclamam que as empresas não cumprem suas contrapartidas (a destinação adequada de embalagens, por exemplo, é dever não do poder público, mas sim do setor empresarial). E o “filho feio” continua sem pai.
O que está sob a responsabilidade das empresas?
A Lei 12.305/2010 mostra que a regra é clara: elas são obrigadas a estruturar circuitos de “logística reversa” (coleta e restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada). Ou seja, o fim dado ao lixo deve ser independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos. Isso se aplica aos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de:
– agrotóxicos
– pilhas e baterias
– pneus
– óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens
– lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista
– produtos eletroeletrônicos e seus componentes e produtos comercializados em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro, e aos demais produtos e embalagens, considerando, prioritariamente, o grau e a extensão do impacto à saúde pública e ao meio ambiente dos resíduos gerados.
Tudo isso mostra o quanto a legislação sobre os resíduos sólidos (aquele lixo que pode ser reaproveitado ou reciclado) vem sendo negligenciada no Brasil há quase 10 anos. Mas como está a situação em Minas Gerais?
Nessa semana, nós do Lei.A trazemos uma série de conteúdos especiais voltados à temática dos resíduos sólidos. Nessa reportagem, vamos conhecer os projetos de lei discutidos na Assembleia Legislativa mineira. Será que estamos adaptando a nossa legislação aos desafios contemporâneos relacionados à montanha de lixo gerada diariamente?
#Conheça
O cenário mineiro quanto aos resíduos sólidos
Em Minas Gerais, a gestão dos resíduos sólidos foi fixada pela Política Estadual de Resíduos Sólidos (Lei 18.031/2009). Ela exige que os municípios elaborem planos locais de gestão de resíduos. Caso contrário, não receberão financiamento nem recursos públicos para implantar projetos de disposição adequada do lixo.
A lei 18.031/2019 também obriga as instituições públicas a editarem normas com o objetivo de dar incentivo fiscal, financeiro ou creditício para programas de gestão integrada de resíduos, em parceria com organizações de catadores de material reciclável.
A Política Estadual de Resíduos Sólidos está funcionando bem?
#Monitore
Analisamos 32 projetos de lei sobre o tema em tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A conclusão foi de que há grande fragmentação de iniciativas, repetição de propostas, ritmos muito diferentes de tramitação de proposições, além da usurpação de responsabilidades entre os setores público e privado.
1 – Falta foco | Chama a atenção o número de projetos de lei sobrepostos, de temas repetidos, anexados uns aos outros.
PL 5245/2018 | Estabelece normas para a disponibilização, por estabelecimento comercial, de utensílios descartáveis biodegradáveis destinados ao acondicionamento e ao manejo de alimentos e bebidas prontos para o consumo.
PL 5266/2018 | Dispõe sobre a obrigatoriedade de os estabelecimentos comerciais disponibilizarem canudos de material biodegradável feito de papel, no âmbito do Estado.
PL 5338/2018 | Dispõe sobre a proibição de fornecimento de canudos confeccionados em material plástico, nos locais que especifica, no âmbito do Estado, e dá outras providências.
PL 740/2019 | Dispõe sobre a obrigatoriedade da utilização de materiais biodegradáveis na composição de utensílios descartáveis na forma que menciona.
PL 828/2019 | Proíbe o uso de canudos e copos não biodegradáveis no Estado.
2 – Fragmentação de iniciativas similares | Há um enorme leque de propostas que obrigam o setor privado a assumir a correta disposição dos resíduos, em diversas áreas de atuação. Uma única lei para todos os itens bastaria.
PL’s que obrigam à logística reversa:
PL 297/2015, PL 5357/2018, PL 1070/2015, PL 1920/2015 | Garrafas Pet
PL 1860/2015 e PL 869/2015 | Pneus
PL 1572/2015 | Filtros de cigarro
PL 1626/2015 | Lâmpadas fluorescentes
PL 1847/2015 | Lixo tecnológico
PL 2251/2015 | Vidros automotivos
PL 103/2019 | Cápsulas de café
3 – O público como solução privada | Uma série de projetos tem por foco a reutilização de rejeitos, seja de mineração ou de fundição, em obras de construção civil, de estrada e casas populares. Prevendo, inclusive, políticas de isenção fiscal e de uso preferencial nas obras sob responsabilidade do poder público estadual.
PL 3161/2015 | Isenta de ICMS produtos para construção civil e pavimentação de estradas derivados de rejeitos da extração de minério.
PL 3162/2015 | Sobre a utilização de rejeitos de minério em produtos para a construção de casas populares e na pavimentação de estradas.
PL 3997/2017 | Utilização preferencial de cimentício (superfície ou revestimento feito à base de cimento) desenvolvido a partir de rejeitos de mineração nas obras de construção e reforma no estado.
PL 83/2019 | Utilização preferencial de areia descartada de fundição nas obras de construção e conservação de rodovias e de cobertura de aterros sanitários.
PL 3432/2016 | Utilização de areia descartada de fundição na construção e conservação das estradas estaduais e na cobertura de aterros sanitários.
4 – A lebre e as tartarugas | Algumas propostas empacam por anos, atravessando diversas legislaturas com numerações diferentes, sendo repetidamente arquivadas e desarquivadas, sem conseguir avançar pelas comissões. Já outros, ligados aos interesses de grandes poluidores, vão adiante contra tudo e contra todos.
PL 778/2015 | Direciona 50% do valor das infrações à Política Estadual de Resíduos Sólidos para despesas do Bolsa Reciclagem, tramita desde 2012.
PL 1680/2015 | Cria cursos para trabalhadores que atuem na coleta seletiva e reciclagem, tramita desde 2011.
PL 3893/2016 | Libera a incineração no processo de destinação final de Resíduos Sólidos, hoje proibida pela Política Estadual de Resíduos Sólidos. A proposta avançou por duas comissões sem discussão, por perda de prazo, sem receber nenhum parecer, e está pronta para ir ao plenário. Esse projeto de lei foi tema de reportagem do Lei.A. Releia aqui.
5 – Boas iniciativas que ainda não saíram do lugar | Entre tantos projetos sobre temas tão variados, é possível encontrar propostas interessantes, objetivas e factíveis, que poderiam apoiar no enfrentamento de questões, que atualmente, recebem pouca atenção do setor público, têm baixa adesão social e quase nenhuma representatividade política.
Todos ainda aguardam o parecer da Comissão de Constituição e Justiça.
PL 344/2019 | Cria o programa estadual de reciclagem automotiva.
PL 792/2019 | Institui a Política Estadual de Promoção da Reciclagem na Escola
PL 5303/2018 | Cria a Política Estadual de Compostagem dos Resíduos Orgânicos nos restaurantes populares e escolas públicas estaduais.
#Aja
Conheça o teor dos projetos de lei em tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais por meio da plataforma do Lei.A, clicando na imagem abaixo. Os projetos são atualizados em tempo real de acordo com o processo legislativo.
Se você quer saber se seu município tem aterro sanitário ou usina de compostagem de lixo, navegue pela plataforma de indicadores ambientais municipais do Lei.A e descubra. São diversos índices para consulta em todos os 853 municípios de Minas – todos fornecidos e atualizados por instituições oficiais. Conheça clicando na imagem abaixo.
Para se aprofundar sobre esse tema, releia a série “Caminhos do Lixo”, que publicamos em 2018 clicando aqui: http://leia.org.br/category/caminhos-do-lixo/
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