Meio ambiente pode sentir impactos de projeto de lei que muda critérios do ICMS Solidário

Lei de distribuição de recursos que se tornou referência para outros estados pode ser extinta em Minas Gerais e meio ambiente deve ser prejudicado. Mas você pode atuar e ajudar a evitar esse retrocesso

O projeto de lei 4.773/17, que propõe novos critérios para a distribuição do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) pode causar retrocesso na atuação dos municípios em relação ao meio ambiente. Caso seja aprovado, o projeto de lei diminuirá o recurso destinado ao ICMS Ecológico, modificando suas regras, e acabará com o princípio de proatividade (dar mais ao municípios que fazem mais) de uma lei que se tornou modelo para o país. Mas você pode atuar e ajudar a evitar isso.

De autoria do deputado Paulo Guedes (PT), o projeto de lei, que está em tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) pode beneficiar regiões de sua base eleitoral em detrimento de áreas onde existem ações e programas municipais de preservação e educação ambiental, penalizando as cidades que mais atuam na preservação das florestas, do patrimônio e na conservação da biodiversidade.

“É um projeto de lei muito grave porque exclui todos os critérios existentes (na chamada lei Robin Hood) e recria apenas o critério meio ambiente, mesmo assim de uma forma muito danosa. Porque, até então, o critério meio ambiente tinha alguns subcritérios como a questão do saneamento, que deixam de existir na proposta nova desse projeto de lei”, afirma André Vieira Colombo, historiador e consultor em Patrimônio Cultural.

Segundo Colombo, o projeto de lei pode impactar áreas como a de saneamento básico e  em questões relativas aos lixões, uma vez que muitos municípios mineiros passaram a tratar esgoto e acabar com os lixões, dando uma destinação correta para seu lixo porque existia o incentivo financeiro do ICMS para isso. “Esse projeto de lei acaba com isso. Será mais um retrocesso na questão ambiental”, conclui o historiador.

 

E você, discorda desse projeto? Quer saber mais? Veja o que fazer

  • CONHEÇA! Procure o Conselho Municipal de Meio Ambiente da sua cidade e entenda como a mudança no ICMS Solidário pode afetar a sua cidade.
  • AJA! Mande um e-mail para o deputado Paulo Guedes (PT), autor da proposta (dep.paulo.guedes@almg.gov.br), manifestando sua opinião. Ou fale com o deputado Leonídio Bouças (PMDB) (dep.leonidio.boucas@almg.gov.br), presidente da Comissão de Constituição e Justiça, que atualmente analisa o projeto de lei.
  • MONITORE E AJA! As comissões de Desenvolvimento Econômico e Administração Pública também irão analisar o projeto de lei 4.773/17. Se receber parecer favorável dessas comissões, ele será votado em primeiro turno pelo plenário da Assembleia Legislativa. Se receber emendas, o projeto voltará a ser analisado pelas comissões, antes de ser votado em segundo turno e seguir para redação final. Você também pode cobrar os deputados dessas comissões.
  • Além das mobilizações regionais, que estão sendo realizadas em todo o Estado, encontra-se em andamento uma petição online destinada ao governador Fernando Pimentel e outras autoridades. Os signatários defendem a não exclusão da lei Robin Hood, prevista pelo artigo 8º do projeto de lei 4773/2017. Até o dia 29 de março foram contabilizadas 2.513 assinaturas contrárias ao projeto de lei.

 

O princípio distributivo do ICMS solidário

O ICMS é um imposto gerado toda vez que alguém compra ou vende uma mercadoria ou presta algum serviço nas áreas de comunicação e transporte intermunicipal ou interestadual, gerando receita aos cofres públicos. Desde que a primeira versão da lei Robin Hood foi implantada em Minas Gerais, em 28 de dezembro de 1995, parte desse recurso passou a ser distribuído aos municípios que mais executam políticas públicas em áreas como turismo, meio ambiente, cultura e esporte.

O projeto de lei 4.773/17 muda a forma como será redistribuído parte do recursos do ICMS, retirando da lei aspectos meritórios dos municípios (“quem faz mais, recebe mais”). Um dos motivos que levou o deputado Paulo Guedes à elaboração da proposta foi um estudo feito por técnicos do Legislativo, que mostra que alguns dos 18 critérios usados hoje pela chamada Lei Robin Hood (conhecida como ICMS Solidário desde 2009) para definir os repasses não estariam funcionando e que seria preciso simplificá-los. No entanto, de acordo com André Colombo, a lei precisa sim de melhoramentos, nas não deve ser revogada.

Segundo Colombo, o projeto de lei coloca em risco as políticas públicas que se desenvolveram graças aos recursos do ICMS Solidário e que dependem dele para sobreviver. “Temos ressaltado que saúde e educação têm limites obrigatórios pelo poder público municipal, já patrimônio, turismo, meio ambiente e esporte não têm nenhum limite obrigatório e também só têm essa receita. Quando o Estado acaba com a única receita dos municípios para essas áreas, o impacto nestas políticas públicas vai ser muito grande”, afirmou.

Desde que começou a tramitar, o projeto de lei recebeu diversas críticas. A principal delas diz respeito ao artigo que revoga a Lei Estadual 18.030/2009, conhecida como Lei Robin Hood. Para o deputado Antônio Jorge (PPS), outro crítico do projeto, a lei Robin Hood foi elaborada após uma ampla discussão com a sociedade e desde que foi aprovada destinou mais recursos os municípios que mais necessitavam.

“A proposta do deputado Paulo Guedes vem, na minha opinião, enviesada com essa falta de sentido do reconhecimento de mérito. O nivelamento proposto pela lei traz um prejuízo para essa ideia de mérito. Além disso, foi arbitrado para o deputado alguns princípios que são caros para ele, mas que a sociedade discorda. A sociedade continua querendo premiar a preservação ambiental, a preservação do patrimônio, a preservação histórica”, afirma o deputado.

Durante audiência pública, realizada no dia 13 de março na Assembleia Legislativa pressionado por entidades da Cultura a do Turismo, Guedes afirmou que está disposto a rever algumas de suas proposições: “Eu, como autor do projeto, já estou convencido de que esses dois critérios (ICMS Cultural e ICMS Turístico) precisam ser mantidos”. Porém, o projeto de lei continua tramitando e, em breve, poderá ser votado em primeiro turno pelo plenário da Assembleia Legislativa.

“Apesar do deputado ter se manifestado pela apresentação de um substitutivo para rever a não exclusão desses critérios – patrimônio, turismo e esportes -, a gente tem que monitorar e continuar mobilizado. Temos um grupo grande e organizado e estamos incentivando a sociedade civil a se posicionar em diferentes regiões do estado”, disse Colombo.

 

ICMS Ecológico: fim do “fator de qualidade”

No que diz respeito ao critério ambiental, a distribuição da cota-parte dos município está pautada atualmente no cálculo do Índice de Meio Ambiente (IMA), que recompensa as prefeituras que investem na manutenção de unidades de conservação, estações de tratamento de esgoto, aterros sanitários e usinas de compostagem, entre outras ações. Ou seja, recebem o ICMS Ecológico os municípios que preservam suas florestas e rios, tratando seus resíduos.

Pelo projeto de lei, o critério Meio Ambiente permanecerá, mas com redução no valor recebido pelos municípios e mudança na forma de cálculo:

  • O valor que atualmente os municípios recebem de ICMS Ecológico seria reduzido de 1,1% para 1%. Parece pouco, mas se já estivesse operando no último ano, quando orçamento do ICMS para o meio ambiente foi de R$ 82 milhões, o valor subtraído equivaleria a R$ 8,2 milhões, quase três vezes o orçamento do Instituto Estadual de Florestas (IEF) para criação e implementação de unidades de conservação em 2018 (R$ 2.786.417) ou mais de quatro vezes o orçamento deste ano da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) para realizar atividades de fiscalização (R$ 1,89 milhão).
  • A nova divisão dos recursos incluirá as chamadas áreas de biomas preservadas, que se juntam às unidades de conservação e a áreas indígenas como pontuação para recebimento. O cálculo da nova lei tomará como base o percentual dessas áreas em relação ao estado e não mais a área do município. Será o fim do chamado “fator de qualidade”, uma série de parâmetros determinados pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) em 2005, que fazem determinadas áreas serem mais ou menos pontuadas no momento de receber recursos.

 

Saiba mais sobre o ICMS

 

  • Pela Constituição de 1988, a cada R$ 100 que o poder público arrecada de ICMS, R$ 75 (75%) pertencem aos Estados e R$ 25 (25%) devem ser repassados aos municípios.
  • Desses R$ 25, ainda por lei federal, R$ 18,75 (75% desse valor), no mínimo, voltam para o município onde foram gerados, pois estão atrelados ao chamado Valor Adicional Fiscal (VAF).
  • Sobre o quarto restante (25%), ou R$ 6,25, cabe às Assembleias Legislativas definirem quais serão os critérios de repasse aos municípios. A polêmica do projeto de lei está exatamente na mudança das regras para divisão destes 25% em Minas Gerais.
  • A distribuição desses R$ 6,25 a cada R$ 100 é regida pela lei 18.030/2009, popularmente chamada de ICMS Solidário ou Lei Robin Hood, pois condiciona o recebimento dessa parte dos recursos do imposto por parte dos municípios à realização de atividades e ao cumprimento de 18 critérios em diversas áreas, inclusive a do meio ambiente (ICMS Ecológico).
  • Portanto, no estágio atual da legislação mineira, o princípio que norteia a divisão entre os municípios é o da proatividade, ou seja, da real prestação de serviço ao cidadão.

 

O que eles dizem

Segundo o deputado Paulo Guedes (PT), em relação ao ICMS Ecológico, a mudança irá beneficiar novamente os municípios localizados no Norte de Minas e no Jequitinhonha, pois além de representar uma compensação pelas áreas de preservação que não geram movimento econômico e, portanto, não participam do critério VAF, também incentiva os municípios a executar políticas públicas de preservação, pois manter áreas de floresta preservadas garantirá o recebimento do ICMS Ecológico. “Um exemplo gritante (de distorção do ICMS Solidário) são os parques ecológicos de Januária e Bonito de Minas, com milhões de hectares que chegam a receber 5 mil vezes menos que o Parque das Mangabeiras, em Belo Horizonte, que é muito menor. É uma regra absurda”, comparou, durante audiência pública realizada sobre o tema.

 

 

“A lei do ICMS Solidário, a popular Robin Hood, traz no seu bojo um princípio muito caro para uma sociedade desigual como a nossa, que é o princípio da equidade. A lei, no ideário da sociedade civil representada, que era a questão do meio ambiente, do patrimônio e da cultura, foi muito relevante. E nós mostramos, por exemplo, um cenário de preservação de patrimônio distinto do país e muito em função do ICMS Solidário. É uma política pública que serviu de exemplo para outros estados, que estão buscando implantar esse mesmo modelo. Ver isso acabar dessa forma é inadmissível”

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