Houve avanços, como a Lei “Mar de Lama Nunca Mais”, a Peab e a CPI de Brumadinho, mas a produtividade caiu após início das sessões virtuais
Saiba o que andou e o que não saiu do lugar nesses quatro anos; Lei.A organizou o que de mais importante aconteceu em cada uma das oito editorias de monitoramento
A discussão e a elaboração de leis ambientais na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) foram irregulares nos últimos quatro anos. Com o desastre da Vale em Brumadinho (2019), ocorrido pouco antes da posse dos novos deputados, a Legislatura se iniciava sob uma enorme pressão da sociedade civil por mudanças.
Nessa atmosfera, a Lei “Mar de Lama Nunca Mais”, o novo marco de segurança de barragens, emperrado desde a tragédia da Samarco, em Mariana (2015), foi aprovada. Também virou lei a Política Estadual para Atingidos por Barragens (Peab) e a atuação da CPI de Brumadinho permitiu a exposição de fraudes em documentos técnicos, tornando as responsabilidades inequívocas.
Todavia, em seguida, em decorrência da Covid-19, as sessões do Plenário e das Comissões passaram a funcionar por meio remoto. Devido à decisão acertada de priorizar os temas ligados à pandemia, a produtividade da Casa em outros assuntos, como o Meio Ambiente, naturalmente caíram, pois as Comissões e o correr dos prazos regimentais foram paralisados.
Desde que o trabalho presencial foi retomado, pouco andou, embora dessa vez devido à antecipação da agenda eleitoral. Nós, do Lei.A Observatório, separamos o essencial dos últimos quatros anos nas formulações de leis ambientais em Minas Gerais. O que andou, o que travou e qual o saldo em cada área acompanhada por Lei.A?
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MINERAÇÃO | O que andou?
A lei “Mar de Lama Nunca mais”, após três anos de tramitação, foi aprovada, em fevereiro de 2019, obrigando o descomissionamento das barragens pelo método a montante e proibindo a construção de novas estruturas.
Ela também estabeleceu novas diretrizes para o licenciamento e a fiscalização das barragens de rejeito em Minas Gerais, proibindo a concessão de licença ambiental para barragens com comunidades na chamada zona de autossalvamento, bem como vedando a disposição de rejeitos sempre que houver alternativa técnica mais segura.

As mineradoras também ficaram obrigadas a apresentar estudos de impacto sobre a estabilidade da barragem em caso de sismos, terremotos e chuvas extremas, além do depósito de caução antes da construção de barragens, como meio de garantir o pagamento de reparações socioambientais em caso de desastre.
Já a Política Estadual de Segurança de Barragens, aprovada em dezembro de 2020, garante assistência às populações afetadas pela instalação, ampliação ou operação de barragens, estabelecendo os direitos, o financiamento e a forma da reparação, incluindo a participação da população nos foros colegiados decisórios.
Outro destaque da 19a Legislatura foi a CPI de Brumadinho, cujo relatório final você confere clicando aqui. Formada em Março de 2019, a Comissão realizou 35 sessões e colheu 149 depoimentos, apontando responsabilidades cíveis e criminais.

MINERAÇÃO | O que não andou e por que ficar de olho?
Na 19a Legislatura da ALMG (2019/2023), 14 projetos de lei sobre mineração passaram a ser monitorados por Lei.A. Alguns deles são boas iniciativas, outros nem tanto. Conheça os mais importantes e saiba por quê ficar de olho:




LICENCIAMENTO E USO DA TERRA
Na área de Licenciamento e Uso da Terra, o saldo da atuação dos deputados nos últimos quatro anos foi ambíguo. Seguindo o exemplo pioneiro da Zona da Mata Mineira, tornaram-se leis PL’s que criaram os polos de agroecologia e de cultura orgânica no Norte de Minas e no Sul e Sudoeste do estado.
Ao se tornarem polos agroecológicos e de produção orgânica, as regiões têm mais apoio para a realização de pesquisas, extensão e suporte técnico, melhores condições de acesso às políticas públicas, incluindo iniciativas voltadas para jovens e mulheres. As leis também reconhecem sistemas agroecológicos e orgânicos como prestadores de serviços ambientais, tornando-os passíveis de serem remunerados.

O BLOQUEIO DO AGROTÓXICO
Por outro lado, chama atenção a força do lobby do agrotóxico na ALMG. Nada menos que dez projetos de lei foram propostos sobre o tema na Legislatura recém encerrada, mas pouquíssimos foram apreciados pela Casa e nenhum tornou-se norma jurídica. Conheça os principais:

O QUE ACOMPANHAR DE PERTO?
Há boas iniciativas em tramitação sobre Licenciamento e Uso da Terra, e outras que indicam forte retrocesso ambiental. O PL 3483 2022, por exemplo, retira da alçada da Superintendência de Projetos Prioritários (a Supri, via rápida de concessão de licenças ambientais do Governo de Minas) os empreendimentos de médio ou grande potencial poluidor.
Há, por outro lado, flagrantes retrocessos em gestação, como o PL que derruba a vedação de produtos que contenham amianto ou asbesto (PL 2437 2021), ou o que cria o licenciamento por decurso de prazo para outorgas de poços artesianos (PL 833 2019).
FLORESTAS E UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
Outra área com muitos PL’s apresentados, mas com baixíssima produtividade, foi a de Florestas e Unidades de Conservação. A única proposição relevante sobre a questão florestal a avançar – o PL 956 2015, que cassa o registo da empresa que vender, comprar, transportar ou estocar madeira extraída ilegalmente – tramita há oito anos na Casa. Atualmente, a proposta aguarda parecer da Comissão de Meio Ambiente.
Na área de Unidades de Conservação, a eficiência do legislativo mineiro é ainda pior. Foram propostos a criação de nada menos que 14 novas Unidades de Conservação no estado, de diferentes categorias de proteção, mas nenhuma foi aprovada. Confira quais são elas:

Fechos: Governo de Minas intervém

O caso mais emblemático do bloqueio às pautas ambientais na 19a Legislatura da ALMG, sem dúvida, é o da Estação Ecológica de Fechos – uma Unidade de Conservação de 602 hectares, com 14 nascentes, cuja vazão atende a 200 mil pessoas, em 38 bairros de Belo Horizonte, Nova Lima e outros municípios.
A expansão de Fechos, proposta no PL 96 2019, opõe o abastecimento humano na Região Metropolitana de Belo Horizonte aos interesses da mineradora Vale. Proprietária da mina de Tamanduá, contígua à Estação Ecológica, a Vale já requereu o licenciamento para expansão da exploração de minério por sobre a área de recarga hídrica.
Com o PL já aprovado em 1o turno em Plenário, o Governo de Minas apresentou um texto alternativo, produzido com dados fornecidos pela Vale, aumentando de 222 para 250 hectares, a partir da “permuta” de áreas. Em lugar das áreas de canga, cruciais para a recarga hídrica dos mananciais, áreas desconexas e irrelevantes para a recarga hídrica, compostas por eucaliptais e mata-seca. Saiba mais clicando aqui.
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NOTA ZERO: ÁGUA E MUDANÇAS CLIMÁTICAS
Dois dos temas mais importantes da atualidade, a proteção aos recursos hídricos e as políticas voltadas às Mudanças Climáticas, terminaram a 19a Legislatura com saldo zero. No caso das Mudanças Climáticas, nenhuma proposição monitorada por Lei.A na ALMG tornou-se norma jurídica. Conheça algumas delas:

A transferência de responsabilidade para o cidadão
No caso da Água, o Lei.A passou a monitorar, desde 2019, nada menos do que 36 novas proposições – entre elas, várias relevantes, como a que aumenta os repasses aos Comitês de Bacias Hidrográfica (PL 3539 2022) e o que institui as Unidades Regionais previstas no novo marco do Saneamento Básico (PL 2884 2021).
Também foram ignorados pelos deputados estaduais mineiros o PL 297 2019, que cria o Programa de Proteção e Conservação de Nascentes e o PL 1306 2019, que detecta a presença de agrotóxicos nas águas. Iniciativas de uso racional, como reaproveitamento de água pluvial ou de lava-jatos e garagens de empresas de transportes, nada andou.
As duas únicas proposições sobre água transformadas em norma jurídica no período são justamente aquelas que empurram para a sociedade civil a responsabilidade pela conservação. São elas a LEI 23491 2019, que instituiu a Semana Estadual de Conscientização sobre o Uso Racional da Água, e LEI 23371 2019, que criou o “Selo Azul” de controle e redução do consumo de água potável.
RESÍDUOS SÓLIDOS
Quatro iniciativas tornaram-se leis na área dos Resíduos, sendo duas sobre o descarte de material infectante durante a pandemia, de caráter emergencial. As outras duas foram a LEI 23943 2021, que criou a Política de Coleta, Tratamento e Reciclagem de Óleo e Gordura, e a LEI 23592 2020, sobre o Programa de Reciclagem de Resíduos Veiculares.

Nos Resíduos Sólidos, a baixa produtividade vem acompanhada da redundância de temas e propostas. Juntos, garrafas PET e reciclagem de vidro somam quase 15 projetos de lei. Os campeões da repetição, no entanto, são os PL’s sobre o banimento de canudinhos/materiais descartáveis de plásticos.

FAUNA
Espécies ameaçadas
Na área da Fauna, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais vem espelhando um fenômeno nacional, tanto nos legislativos estaduais como no Congresso Nacional, de prioridade dada aos temas da proteção, direitos e bem-estar animal. Isso se reflete no próprio volume de proposições relacionadas ao tema – cerca de 70% dos projetos monitorados por Lei.A sobre fauna diz respeito a animais domésticos.
Dois projetos foram aprovados no período, criando a LEI 23724 2020, que define maus tratos contra animais – há pelo menos outros sete PL’s sobre o tema em tramitação – e a LEI 23863 2021, que dá o direito ao cidadão de alimentar animais de rua. Nenhum dos projetos monitorados por Lei.A sobre fauna silvestre virou lei.
Vale lembrar: por meio da Portaria MMA 178, de junho de 2022, o Governo Federal atualizou a listagem da flora e da fauna ameaçadas no Brasil. Segundo o documento, 280 espécies deixaram o status de ameaçadas e 131 tiveram o grau de risco reduzido. Por outro lado, 2.749 espécies permaneceram na mesma categoria de risco e 1.462 espécies entraram na lista.

PATRIMÔNIO CULTURAL
Assim como no Meio Ambiente Natural, o Patrimônio Cultural também é palco de interesses e conflitos. De todas as oito editorias cobertas pelo monitoramento legislativo de Lei.A, o Patrimônio Cultural é, de longe, a que possui o maior número de proposições transformadas em normas jurídicas, dez no total.
Isso, todavia, se deve ao lado mais festivo do reconhecimento cultural. Os PL’s que envolvem conflitos, sobretudo entre conservacionismo e mineração, têm dificuldade de tramitar na ALMG. A PEC 67 2021, que tomba a Serra do Curral, ou o PL 513 2019, que define os limites de conservação da Serra da Piedade, se arrastam.

#aja
A nova composição da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, ao final das eleições de 2022, não saiu tão nova assim. Dos 77 deputados e deputadas estaduais do estado, cerca de dois terços (ou 52 parlamentares) conseguiram se reeleger em 2022.
Ao mesmo tempo, a 20a Legislatura da ALMG (2023-2027) terá um recorde de parlamentares mulheres: 15 deputadas. Isso muda alguma coisa para a pauta ambiental? Quais são as perspectivas de avanços na legislação mineira nas diversas áreas do Meio Ambiente?
Fique ligado. Em breve, nós, do Lei.A, vamos traçar um perfil dessa nova Assembleia e discutir o que a sociedade civil pode fazer para que seus interesses sejam ouvidos e respeitados.