Estado de Minas Gerais possui programa pioneiro de proteção do patrimônio cultural
Quanto mais dinheiro se investe na proteção, mais dinheiro é destinado ao investimento
Minas Gerais possui a maior quantidade de patrimônio culturais protegidos no Brasil. Conjuntos paisagísticos e núcleos históricos de cidades como o Serro, Ouro Preto, Mariana e Sabará estão entre os primeiros tombados pelo então Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico (Sphan), na década de 1930. Daqui saíram tradições seculares também registradas como patrimônios imateriais brasileiros, como o Modo Artesanal de se Fazer o Queijo.
Não por menos, o estado tornou-se também pioneiro no país em ações que têm por objetivo a proteção do rico patrimônio cultural presente no território. Aqui neste conteúdo especial, nós, do Lei.A, trazemos uma delas, considerada a mais importante pelos resultados apresentados. Trata-se do ICMS Patrimônio Cultural.
O Robin Hood mineiro
O ICMS é um imposto que o estado cobra sobre a venda de produtos e serviços, como por exemplo a venda de um liquidificador e ou a contratação de um pacote de serviços de telefonia. No preço do produto ou serviço está embutido o valor do imposto, que é recolhido pelas empresas fornecedoras ao estado. Faça um teste. Pegue sua conta mensal de telefone. Irá notar que entre os itens que vão compor o valor total, está discriminado o valor relativo ao ICMS incidente sobre o serviço.

De acordo com a Constituição Federal (art. 158, inciso IV), 25% do ICMS arrecadado pelos estados pertencem aos municípios. Porém, a proporcionalidade dessa distribuição pode seguir critérios e leis estaduais distintas. Os mais velhos irão lembrar das polêmicas em torno da Lei Robin Hood (Lei Estadual nº 18.030/2009), que levava esse nome por seguir uma lógica onde os municípios mais pobres de Minas Gerais recebiam um percentual maior dos repasses do ICMS, com relação aos mais “ricos”.

Robin Hood e o Meio Ambiente Cultural
Um dos novos critérios diferenciados para a distribuição do ICMS, inserido dentro da Lei Robin Hood, acabou por revolucionar as políticas públicas municipais no que tange ao Meio Ambiente Cultural. Trata-se da Lei Estadual nº 12.428/1996, pela qual parte do ICMS arrecadado (1% sobre os 25%) é distribuído aos municípios que investem na proteção dos seus patrimônios culturais.
De acordo com a lei, o critério “patrimônio cultural”, denominado ICMS Patrimônio Cultural, é formado por um índice calculado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG), somando-se as notas dos seguintes atributos:
- Cidade ou distrito com seu núcleo histórico urbano tombado no nível estadual ou federal
- Somatório dos conjuntos urbanos ou paisagísticos, localizados em zonas urbanas ou rurais, tombados no nível estadual ou federal
- Bens imóveis tombados isoladamente no nível estadual ou federal, incluídos seus respectivos acervos de bens móveis, quando houver
- Bens móveis tombados isoladamente no nível estadual ou federal
- Cidade ou distrito com seu núcleo histórico urbano tombado no nível municipal
- Somatório dos conjuntos urbanos ou paisagísticos, localizados em zonas urbanas ou rurais, tombados no nível municipal
- Bens imóveis tombados isoladamente no nível municipal, incluídos seus respectivos acervos de bens móveis, quando houver
- Bens móveis tombados isoladamente no nível municipal
- Registro de bens imateriais em nível federal, estadual e municipal
- Educação patrimonial municipal
- Inventário de Proteção do Patrimônio Cultural elaborado pelo Município
- Criação do Fundo Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural
- Existência de planejamento e de política municipal de proteção do patrimônio cultural e outras ações
Como funciona o sistema do ICMS Patrimônio Cultural
O programa ICMS Patrimônio Cultural instituído em Minas Gerais beneficia os municípios que mais investem na proteção do patrimônio cultural. Com maior número de bens culturais protegidos, maior a responsabilidade do município e mais recursos são necessários para a preservação desse patrimônio.
Ou seja, quanto mais se investe, mais dinheiro o município recebe do estado. É um sistema que se retroalimenta. O repasse realizado pelo estado pode ser “carimbado” pela legislação municipal para que esse valor ou parte dele seja utilizado, exclusivamente, em ações de preservação do patrimônio cultural, tornando o programa mais eficaz e contribuindo para a proteção da memória e da identidade daquele território.
Funciona assim. O município investe em políticas e projetos de proteção e preservação do patrimônio cultural e envia para o Iepha-MG as informações. O Iepha-MG compila as informações e realiza uma pontuação a partir de critérios previamente definidos, de modo a estabelecer o Índice de Patrimônio Cultural (PPC). O índice (pontuação) é enviado para a Fundação João Pinheiro que realiza o cálculo a ser destinado pelo estado aos municípios. De posse desse cálculo, o estado repassa o valor aos municípios. O repasse é mensal e varia de acordo com a pontuação e o ICMS arrecadado no mês.

Mas a lógica de distribuição do ICMS Patrimônio Cultural não pode ser vista como algo estático. Existe um profundo sistema de avaliação das informações fornecidas pelos municípios e seus Conselhos Municipais de Patrimônio Cultural. A análise do Iepha-MG baseia-se em três eixos de comprovação de gestão patrimonial e comprovação de atuação na proteção dos bens culturais:
- GESTÃO I Existência de uma Política Municipal de Proteção ao Patrimônio Cultural criada por lei e um Fundo Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural para fazer a gestão dos recursos, investimentos e despesas
- PROTEÇÃO I Informação e documentação sobre os 03 instrumentos de proteção do patrimônio cultural (Inventário do Patrimônio Cultural, Processos de Tombamento de Bens Materiais e Processos de Registro de Bens Imateriais)
- SALVAGUARDA E PROMOÇÃO I Documentação de Laudos Técnicos do Estado de Conservação dos Bens Materiais Protegidos, Relatórios de Implementação das Ações e Execução do Plano de Salvaguarda dos Bens Imateriais Protegidos, Programas de Educação Patrimonial e Difusão das ações de proteção
Diante das condições impostas para a análise e a pontuação, o Iepha-MG tem em suas mãos um repositório de informações sobre o patrimônio cultural existente no estado, possibilitando que políticas públicas possam ser promovidas e estudos sejam realizados.
O ICMS Patrimônio Cultural como política pública estadual descentraliza para os municípios a proteção de bens culturais, fomenta a organização estrutural patrimonial e distribui recursos para a preservação da memória e identidade do povo mineiro, fortalecendo os laços comunitários e a ideia de pertencimento ao território.
Por isso, não pode se caracterizar como corrida arrecadatória, que visa somente ao recebimento de valores do estado e banalize a patrimonialização de qualquer bem uma gestão de papel apenas para cumprir as formalidades exigidas pelo Iepha-MG.
#monitore
Como anda a distribuição do ICMS Patrimônio Cultural no estado
No que diz respeito ao ICMS Patrimônio Cultural, os dados anuais indicam que os municípios que possuem bens culturais que remetem à história colonial e ao estilo barroco tombados em âmbito federal associados à atividade econômica minerária no estado têm recebido maior parcela no repasse.
Confira a pontuação dos municípios (1996a 2022) no site do Iepha-MG

Com base na pontuação enviada pelo Iepha-MG, a Fundação João Pinheiro realiza o cálculo do valor que será repassado aos municípios. Dos 853 municípios mineiros, apenas 38 não pontuaram no exercício 2022.
No critério de pontuação, o instrumento de tombamento (saiba o que é tombamento clicando aqui) é um dos atributos de maior peso para a pontuação, assim como a existência de lei municipal que contenha política pública patrimonial e crie o conselho municipal do patrimônio cultural.
Embora ações de preservação de bens culturais imóveis, por exemplo, não sejam baratas (podem ultrapassar o valor de 1 milhão de reais para a reforma de uma igreja, por exemplo), o estado repassou aos municípios no ano de 2020 a quantia de R$ 102.989.144,40 somente a título de ICMS Patrimônio Cultural.
No entanto, o critério de maior pontuação e de maiores valores repassados não significa que determinados municípios foram mais beneficiados que outros. De 2017 para 2018, houve evolução da distribuição de ICMS Patrimônio Cultural a mais municípios.
A representação gráfica do mapa de Minas Gerais abaixo, simboliza os valores repassados aos municípios nos anos de 2017 e 2018.

Confrontando os dados de estimativa de população do IBGE para 2020 dos municípios mineiros com os valores repassados a título de ICMS Patrimônio Cultural, pode-se verificar que essa parcela tem representatividade importante para a composição das receitas municipais.
Serra da Saudade, por exemplo, município menos populoso de Minas Gerais e do Brasil, localizado na região Centro-Oeste do estado, com estimativa em 2020 de 776 habitantes, recebeu R$ 2.026.407,43 de repasse de ICMS. O critério ICMS Patrimônio Cultural correspondeu a 12,54% desse valor.
As Folias de Reis dos Alfredos e dos Tatu são manifestações culturais de Serra da Saudade registradas como patrimônio cultural imaterial de Minas Gerais. Veja aqui e aqui vídeos de folias da cidade.
A Festa do Rosário também é tradição em Serra da Saudade e registrada como patrimônio imaterial. Veja aqui parte dessa manifestação.
No site da Fundação João Pinheiro, você encontra, entre outras informações relevantes, todos os dados sobre a distribuição do ICMS no estado. Assim, através de uma consulta rápida, você descobre quanto o seu município recebeu de ICMS Patrimônio Cultural nos últimos anos.
#aja
Seja um Robin Hood: ajude o seu município a proteger seus patrimônios culturais (e a receber mais recursos)
E você, sabe se o seu município participa do Programa ICMS Patrimônio Cultural?
- Acesse as redes sociais I Acesse as redes sociais e sites do Iepha-MG (http://www.iepha.mg.gov.br / @iepha_mg) e do Iphan (http://portal.iphan.gov.br / @iphangovbr), procure os dados, dê opiniões e sugestões sobre a atuação desses órgãos
- Informe-se I Procure a Secretaria de Cultura do seu município e se informe sobre a existência de políticas públicas municipais de proteção do patrimônio cultural. Saiba também quando ocorrem as reuniões dos Conselhos e quais bens culturais são protegidos pelo seu município. Na plataforma do Lei.A (www.leia.org.br), você encontra os bens protegidos em todo o estado de Minas Gerais
- Participe de reuniões I Participe das reuniões do Conselho Municipal de Patrimônio Cultural e da Câmara de Vereadores propondo a preservação de determinado bem cultural de valor significativo para a comunidade e opinando contra retrocessos. As reuniões são públicas e devem ser acessíveis
- Seja um conselheiro I Procure o Conselho Municipal de Patrimônio Cultural, veja quem são as entidades que o compõem e candidate-se a uma vaga
- Ajude I Compareça e participe das manifestações culturais, consuma produtos e contrate serviços de modos de fazer e ofícios tradicionais da sua região
- Denuncie I Acione o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, a Polícia Militar e a Secretaria Municipal de Cultura caso veja danos ao patrimônio cultural