Governo de Minas Gerais quer mudar gestão das águas e cria polêmica

Comitês de bacias hidrográficas criticam falta de diálogo, retirada de poder da população, inconstitucionalidade e contingenciamento de recursos 

Governo estadual defende reduzir de gastos, melhorar resolução de problemas e ampliar resultados

Nós do Lei.A procuramos explicar o tema didaticamente e municiar você de informação para que possa agir

 

Você sabia que o Governo de Minas Gerais quer mudar os processos de gestão dos recursos hídricos, ou seja, da água que bebemos, usamos para nossas necessidades domésticas, para produzir alimentos, manter o meio ambiente equilibrado, entre outras coisas?

Essa é a  mais recente polêmica ambiental em Minas Gerais, após o Governo de Minas apresentar proposta para alterar a gestão dos comitês de bacias hidrográficas. Aliás, você sabe como são geridos os recursos hídricos no estado?

 

#Conheça

Desde o final da década de 1990, no Brasil e em Minas Gerais, a gestão sobre as fontes de água é feita a partir da divisão territorial por “bacias hidrográficas”. Isso ocorreu quando da implantação da Política Nacional de Recursos Hídricos e por meio da lei federal 9.433/97 e estadual 13.199/99.

Em Minas Geras, foram definidas 36 bacias hidrográficas, que possuem seus próprios “comitês”. Estes são formados paritariamente por representantes do poder público, usuários das águas e organizações da sociedade civil. Ou seja, nascem sobre a lógica da gestão descentralizada e colaborativa, onde a população, por meio de seus representantes, podem atuar diretamente nos processos de tomadas de decisões sobre o uso dos recursos hídricos. 

 

 

Entre os 36 comitês de bacias hidrográficas de Minas Gerais, 12 deles recebem recursos para execução de suas atividades via cobrança pelo uso da água, que são aqueles que pagam pelo consumo, uma vez que têm ganhos comerciais com a distribuição do recurso hídrico. Outros 24 são financiados apenas pelo Fundo de Recuperação, Proteção e Desenvolvimento Sustentável das Bacias Hidrográficas do Estado de Minas Gerais (Fhidro). Esse recurso provém, principalmente, da compensação financeira paga pelas hidrelétricas por áreas inundadas por seus reservatórios. Ele é repassado ao governo estadual que, por sua vez, deve destinar os recursos aos comitês.

Os recursos arrecadados pela cobrança no uso das águas são repassados aos comitês e utilizados para financiar estudos, projetos e obras que visem a melhoria da qualidade da água e a redução da poluição, através do tratamento de esgotos, gestão ambiental e a participação social. Já os recursos originados do Fhidro são para estruturação e operacionalização dos comitês.

Entre as principais funções dos comitês de bacia hidrográfica destacam-se:

  • implementar os instrumentos técnicos de gestão e conservação;
  • mediar conflitos provenientes dos usos múltiplos da água;
  • garantir uso da água para o bem estar da comunidade e para o desenvolvimento sustentável da economia naquele território.

Fonte: IGAM, 2016 (http://comites.igam.mg.gov.br/mapa-unidades-de-planejamento)

 

http://leia.org.br/contingenciamentos-de-repasses-coloca-em-xeque-trabalho-de-comites-de-bacias-hidrograficas-em-minas-gerais/

 

#Monitore

O Governo de MG quer mudar isso

Onde está a polêmica? O Governo do Estado de Minas Gerais apresentou uma proposta para mudar essa lógica em torno da gestão das águas e os seus usos da forma como funciona. Pela proposta apresentada, a divisão territorial não se daria mais por “bacias hidrográficas”, mas sim pelo que está sendo chamado de “Regiões de Gestão”. Os 36 comitês de bacias hidrográficas fariam parte do sistema, porém aglutinados e inseridos em 14 “Unidades Estratégicas de Gestão.” 

 

Explicações, críticas e discordâncias

De acordo com a proposta formulada pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), a mudança visa a “busca por mais racionalização de recursos, de modo a gerar resultados mais efetivos. Suas diretrizes são reduzir gastos não finalísticos, dar pragmatismo e efetividade à gestão, melhorar a informação de base e se dedicar à resolução de problemas específicos”.

Porém, a proposta encontrou extrema resistência e questionamento por parte da sociedade civil e do movimento ambiental mineiro. A alegação é de que houve atropelo (inicialmente a proposta foi apresentada apenas para o Conselho Estadual dos Recursos Hídricos, ignorando os gestores dos 36 comitês). Também criticou-se a falta de detalhamento das mudanças propostas e questionou-se a possível inconstitucionalidade da proposta, uma vez que o território de gestão previsto em lei é delimitado pelos limites das bacias hidrográficas. Além disso, há o receio, pela concentração de atribuições proposta pelo governo e pela redução dos espaços de participação da sociedade civil, de que a gestão dos problemas específicos de cada região seja negligenciada. 

 

Pensando em ampliar e municiar a discussão, nós do Lei.A apresentamos algumas opiniões de atores importantes nesse processo de possível remodelagem da gestão das águas em Minas Gerais.

 Francisco Generoso (coordenador especial do Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente do Ministério Público de Minas Gerais) | “Temos uma preocupação bastante relevante em relação à conformidade dessa proposta com as diretrizes e fundamentos da lei 9.433/97, que é a lei que estabelece a Política Nacional de Recursos Hídricos”(…)“Qualquer iniciativa que venha a contrariar ou a inobservar esses fundamentos, estabelecidos no regramento federal, poderá padecer do vício insanável da inconstitucionalidade”.

 

Hideraldo Buch  (coordenador do Fórum Nacional de Comitês de Bacia) | Segundo ele, a lei 9.433/97 é clara quanto à definição da bacia hidrográfica a partir de uma ordenação territorial e quanto à descentralização do processo decisório por meio dos comitês: “O Plano Estadual de Recursos Hídricos de Minas Gerais é bem claro: não se pode fundir comitês”.

 

Clarissa Bastos Dantas (gerente de Apoio aos Comitês de Bacias Hidrográficas e Articulação à Gestão Participativa do Igam, órgão do Governo do Estado de Minas Gerais) | segundo ela, a proposta apresentada pelo órgão busca repensar toda a gestão dos recursos hídricos no Estado e não se limita à fusão de comitês. “Por isso começamos pelo Conselho Estadual, que tem representação ampla e é o lugar legal dessa discussão”, justifica. Ela admitiu no entanto, “falta de tato” por parte do governo no processo de discussão e apresentação do projeto, mas enfatizou que o debate agora proposto vai subsidiar as decisões de Conselho Estadual. Na visão do governo, com 14 territórios é possível pensar de forma mais homogênea a gestão dos recursos hídricos. Ela lembrou o modelo francês, que possui um território de tamanho similar a Minas Gerais e possui apenas seis comitês, contando com 192 comissões locais. 

 

Marcus Vinicius Polignano (coordenador-geral do Fórum Mineiro de Comitês de Bacias) | Segundo ele, as “Regiões de Gestão” e as “Unidade Estratégicas de Gestão”, previstos no Plano Estadual de Recursos Hídricos, devem coexistir com as bacias, e não substitui-las. “O papel da Unidade Estratégica seria para planejamento e monitoramento, não seria para aplicação de instrumento de gestão”, afirma. Também criticou a mudança da lógica territorial das bacias, com base em atividades econômicas causadoras de impacto. “Não podemos transformar a questão da discussão de recursos hídricos para uma atividade finalística única. Diz a lei que nós temos que garantir os usos múltiplos, e não transformar isso numa agenda econômica direcionada a setores específicos”, completa.  Por fim, Polignano criticou a insinuação do governo de que o modelo atual de gestão pelos comitês é ineficiente, sendo que, na verdade, é o próprio governo quem tem contingenciado os recursos que deveriam  estruturao trabalho dos comitês (sobre isso, clique aqui e releia o que publicamos). 

Um passo atrás

Após a polêmica levantada em audiência pública promovida pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais, no dia 12 de novembro desse ano, o governo estadual recuou. Decidiu retirar a proposta da pauta do Conselho Estadual de Recursos Hídricos e passou a discuti-la também com os comitês de bacias hidrográficas e outros especialistas da temática da água.

Uma das medidas foi a realização de um workshop, que contou com a presença de especialistas, conselheiros dos comitês de bacias hidrográficas e representantes de órgãos e secretarias do governo estadual. Segundo o Igam, os resultados apurados a partir do workshop serão considerados como elementos fundamentais na melhoria da proposta em debate. 

 

#Aja

 Se você não faz parte do movimento ambiental, se sensibilizou pelo tema e quer contribuir com quem luta por essa causa (que no fundo, é sua) conheça, participe e fortaleça entidades como os comitês de bacias hidrográficas. Mexa-se! Eles realizam diversas ações educativas e reuniões abertas. 

No caso da Bacia do Rio das Velhas, visite o site do CBH Velhas e veja como participar: http://cbhvelhas.org.br/

Se ainda está em dúvida se sua cidade faz parte desse problema, pesquise!  Descubra no mapa a qual bacia hidrográfica a sua região pertence: http://leia.org.br/#pesquisaMunicipio

Utilize a plataforma do Lei.A e saiba quais são as leis em tramitação que tratam de diversos temas ligados ao meio ambiente, incluindo o tema: ÁGUAS. Saiba aonde são os locais de captação, a qualidade da água e a localização, se houver, da estação de tratamento de esgoto de seu município: link (http://leia.org.br/tema/mapa/26/agua/)

 

Ao visitar a plataforma do Lei.A, ao lado direito da tela, você pode pesquisar qual ou quais foram os deputados estaduais que receberam maior número de votos na última eleição no recorte do município de seu interesse e cobre dele uma postura em defesa das ÁGUAS de Minas Gerais.

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