Obrigar o informe sobre agrotóxico nas embalagens de alimentos e proibir a pulverização aérea também foram proposta abandonadas pela Assembleia Legislativa, mas que podem ser reapresentadas tão logo os novos deputados assumam em fevereiro
Você sabia que os deputados mineiros consideraram inconstitucional o fim da pulverização aérea de agrotóxicos em Minas Gerais? E que também deixaram adormecer outro projeto de lei que obrigava que o uso desse tipo de veneno constasse no rótulo dos produtos alimentícios que você consome?
Pior: você sabia que 14 tipos de agrotóxicos banidos da Europa pelo alto risco à saúde e à vida das pessoas continuam a ser usados no nosso estado?
Na quinta matéria da série “Caminhos do agrotóxico”, nós do Lei.A mostramos para você boas iniciativas contra o uso desse tipo de veneno, que foram simplesmente abandonadas pela atual legislatura da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
1 – Em Minas Gerais pode “chover” veneno
Um projeto de lei derrubado pelos deputados desta legislatura pedia o fim da pulverização de agrotóxicos por aviões nas lavouras de Minas Gerais. A prática é proibida na União Europeia, desde 2009, em função do potencial de contaminação ambiental e da vulnerabilidade à que a população fica exposta nas regiões de produção intensiva.
“Cerca de 70% do agrotóxico aplicado por avião não atinge o alvo, ou seja, o produto vai atingir vizinhos: outros agricultores e plantações, casas, escolas, hospitais, reservas ecológicas e mananciais que abastecem as cidades. É a chamada deriva, que contamina solos, rios e não respeita cercas nem fronteiras” explica Rogério Correia (PT), deputado que propôs o projeto de lei.
Apesar de todas essas evidências e do exemplo europeu, a proposta foi declarada inconstitucional pela Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia por “proibir atividade permitida pela legislação federal”. A decisão é contestada por integrantes da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida, que defendem a autonomia de estados e municípios para restringir esse tipo de prática.
Para ler a íntegra do projeto de lei 2192, clique aqui.
Para ler o parecer da CCJ que declara a proposta inconstitucional, clique aqui.

Links para reportagens sobre o caso:
http://g1.globo.com/goias/noticia/2013/05/piloto-de-aviao-agricola-que-intoxicou-varias-pessoas-em-escola-esta-preso.html
https://oglobo.globo.com/brasil/vitimas-de-pulverizacao-de-agrotoxico-em-escola-rural-de-goias-ainda-sofrem-com-intoxicacao-10597709
https://deolhonosruralistas.com.br/2018/03/19/syngenta-e-condenada-por-contaminar-com-agrotoxicos-92-alunos-e-funcionarios-de-escola/
2 – O que o europeu não come, os olhos dos deputados mineiros não veem
Outro projeto de lei derrubado na Assembleia Legislativa previa o fim do uso, em Minas Gerais, de 14 tipos de agrotóxicos proibidos pela União Europeia. De autoria do deputado Fred Costa (PEN), o PL 351 foi oficialmente apresentado em 2015.
“As substâncias que pretendemos proibir foram banidas em diversos países por apresentar, entre outros problemas, toxicidade aguda, carcinogenicidade, neurotoxicidade e mutagenicidade. Mesmo assim, a agricultura desses países não parou. A título de que continuaríamos expondo a tais perigos a saúde de nossa população?”, justificou, à época, o deputado Fred Costa.
Estranhamente, o projeto tão defendido por órgãos da vigilância sanitária e do meio ambiente acabou retirado de pauta a pedido do próprio autor, deputado Fred Costa.
Entre as substâncias que poderiam ter sido proibidas está o Acefato, cuja utilização ultrapassou mais de mil toneladas em Minas Gerais no último ano. Trata-se de um inseticida utilizado com frequência em plantações de couve, amendoim, brócolis, fumo, repolho, melão, soja, citros e batata. A ingestão diária considerada aceitável é de 0,03 mg. Quando consumida em excesso, pode causar neurotoxicidade que leva ao aumento de células carcinogênicas.
Para ler a íntegra do projeto de lei 351, clique aqui.
3 – Você saberia se está comendo resíduos de agrotóxico, mas…
Quando você vai ao supermercado, encontra no rótulo dos alimentos que consome, informações sobre os teores de sal e açúcares ou sobre a presença de glúten ou lactose, entre outros. Se é assim, não acha que seria importante saber também se aquele alimento – in natura ou industrializado – foi produzido com uso de agrotóxicos e os riscos que eles podem trazer para a saúde da sua família?
Para responder a esta lacuna, nada menos que três projetos de lei foram apresentados por deputados estaduais para obrigar a rotulagem de alimentos com informação sobre o uso de agrotóxico nos produtos alimentares comercializados no Estado, incluindo alimentos in natura, processados parcialmente e industrializados. O que mais avançou foi o projeto de lei 1604/2015, que obrigava também a inclusão da mensagem “produzido com agrotóxico” nas caixas de acondicionamento ou exposição de alimentos in natura, vendidos no atacado ou a granel.
Uma boa ideia, certo? Mas, inexplicavelmente, não para os deputados da Comissão de Desenvolvimento Econômico da Assembleia. É que o projeto de lei 1604, apresentado em 2015, aguarda há 18 meses um parecer dessa comissão para poder avançar. “Estamos reafirmando a busca pela transparência e atendendo aos direitos básicos do consumidor de ter todas as informações que possam auxiliar na tomada de decisões que lhe dizem respeito”, cobrou o proponente da proposta, deputado Leo Portela (PR).
Procurada pelo Lei.A, Maria Aparecida Miranda, integrante do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea-MG), diz que o abandono do projeto reflete a posição histórica dos deputados em favor do agronegócio.
“Para muitas pessoas não se trata de produção de alimentos, mas de produção de dinheiro. Como parte desse ativismo, faremos a mobilização necessária junto aos deputados estaduais para que todos os projetos de lei em favor da alimentação saudável sejam reapresentados”, afirmou.
Para ler a íntegra do projeto de lei 1604, clique aqui.
Próxima reportagem
Passamos o mês de outubro falando sobre o que são os chamados agrotóxicos; sobre seus efeitos nocivos à saúde de quem planta e quem come os alimentos; sobre as possibilidades de se incentivar formas mais saudáveis de se produzir e também sobre projetos que poderiam reduzir o uso desses venenos em Minas Gerais. Abriremos o mês de novembro com a penúltima reportagem da série “Caminhos do agrotóxico” falando sobre uma disparidade gritante no Brasil: por que a agroecologia não recebe os mesmos subsídios do agronegócio ou dos produtores de agrotóxico? O que poderia ser feito se essa forma de produção tivesse o mesmo tratamento fiscal dos grandes exportadores de grãos?
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