De onde surgiram os Ministérios? Entenda a história e a função destes órgãos

Nós, do Lei.a, conversamos com uma cientista política e com um ex-ministro para entender a potência desses departamentos para as decisões nacionais. 

Pouco depois de sua cerimônia de posse, no dia 1 de janeiro de 2023, o presidente Luís Inácio Lula da Silva publicou uma Medida Provisória – a primeira em seu governo – estabelecendo a criação de 31 ministérios e mais seis órgãos com o mesmo status em sua organização administrativa. No total, são 37 ministérios que irão atuar na Esplanada nos próximos quatro anos, sendo 14 pastas a mais se comparado à gestão anterior, de Jair Bolsonaro. A novidade  é a criação do Ministério dos Povos Indígenas, a recriação das pastas de Planejamento e Orçamento; Trabalho e Emprego; Previdência Social; Direitos Humanos e Cidadania; Cultura; Esporte; e Portos e Aeroportos, setores ligados a outros ministérios na base do último governo. 

Mas, de fato, qual é a função desses departamentos dentro de um governo federal? Qual a diferença em ter uma diversidade de pastas, como fez o atual presidente, ou um número mais enxuto delas, como escolheu Fernando Collor ou Bolsonaro? Entenda, no material de hoje, a origem e os encargos dos ministérios, como eles são formados e sustentados e como a sociedade civil pode acompanhar e influenciar  parte das escolhas tomadas por eles. 

#conheça

A origem dos ministérios no Governo Federal se deu no contexto do Brasil Império – período da história brasileira entre a Independência do Brasil (7 de setembro de 1822) e a Proclamação da República (15 de novembro de 1889). Mais precisamente em 3 de Julho de 1822, Dom Pedro II inaugurou o Ministério da Justiça, chamado na época de Secretaria de Estado de Negócios da Justiça. Por meio do Decreto Imperial nº 523 de 20 de Julho de 1847, o monarca instaurou um cargo equivalente ao de primeiro-ministro. 

O Poder Executivo, na época operado pelo presidente do Conselho de Ministros, estava subordinado ao Poder Moderador, garantido pela Constituição de 1824 e exercido pelos imperadores do Brasil com o objetivo de harmonizar os demais poderes do império. O partido político ganhador das eleições (Partido Liberal ou Partido Conservador) era o que organizava o Gabinete de Ministros.

O presidente do Conselho de Ministros era indicado pelo Imperador (Dom Pedro II) respeitando o resultado das eleições, mas os demais Ministros eram escolhidos pelo indicado a presidir o gabinete. A partir da proclamação da República os cargos de Ministros passarem a serem indicados pelo  o presidente da República.

Desde o Brasil Império até hoje, centenas de pessoas já ocuparam os cargos dos ministérios, desenvolvendo a função de auxílio governamental, tomada de decisões sobre assuntos diversos e discussões de propostas sobre os temas competentes. Para a pesquisadora e cientista política Magna Inacio, do PEX Network da Universidade Federal de Minas Gerais, para entender a origem e a função dos ministérios no Brasil é preciso resgatar como funciona o sistema presidencialista por aqui. 

O Poder Executivo é responsável por executar,  fiscalizar e gerir as leis de um país. Nele, estão englobados  a Presidência da República, Ministérios, Secretarias da Presidência, Órgãos da Administração Pública e os Conselhos de Políticas Públicas. No município, o Poder Executivo é representado pelo Prefeito enquanto nos estados, é representado pelo Governador. O Poder Legislativo é o poder que estabelece as Leis de um país. Ele é composto pelo Congresso Nacional, ou seja, a Câmara de Deputados, o Senado, Parlamentos, Assembleias, para o qual a atribuição central é de propor leis destinadas a conduzir a vida do país e de seus cidadãos. Já o poder Judiciário atua no campo do cumprimento das Leis. É o Poder responsável por julgar as causas conforme a Constituição e os demais arcabouços legais do país. Para isso, sua composição conta com juízes, promotores de justiça, desembargadores e pelos  ministros, representados por Tribunais, com destaque para o Supremo Tribunal Federal (STF). O poder Judiciário só age mediante provocação de algum membro da sociedade, governo ou do ministério público. 

“Diferente de outros países, no Brasil o poder Executivo tem um poder muito grande de iniciar uma legislação. A gente chama isso de poder pivotal, ou seja, uma posição de destaque dentro da diplomacia. Ele pode decretar medidas provisórias, propor emendas constitucionais, leis complementares e ordinárias… tudo isso está ao alcance do Executivo”, explica. Dentre esses poderes do presidente em exercício, está o de criar, via medida provisória, os ministérios que o irão acompanhar durante o mandato. “ Assim como nomear quem irá ocupar esses cargos, o presidente pode demitir essas pessoas a qualquer momento. Em alguns países, tanto a nomeação quanto a demissão precisam passar por uma aprovação do Parlamento, mas aqui não é o caso”. 

Segundo a pesquisadora, a criação ou extinção de determinado ministério em um governo pode mudar de forma importante a execução de políticas públicas direcionadas a uma área específica, dependendo de como o presidente distribui essas competências. “Tivemos um bom exemplo de como isso aconteceu no governo anterior, de Jair Bolsonaro. Ele tentou transferir a Fundação Nacional do Índio (Funai) do Ministério da Justiça para o Ministério da Agricultura. O que foi objeto até de ação no Supremo Tribunal Federal (STF) na qual houve um  entendimento de que colocar Funai dentro do Ministério da Agricultura geraria um conflito de interesses, uma vez que é uma pasta que sofre influência do agronegócio, naturalmente. E isso certamente teria como consequência a perda de mais direitos dos povos indígenas. Essa atitude já apontava quais seriam as prioridades da gestão de Bolsonaro”. Para Magna, é de extrema importância que a sociedade civil esteja atenta à forma como essas estruturas são organizadas, para que uma atitude como esta não passe despercebida. 

#monitore

A quantidade de ministérios é sempre definida pelo presidente da república, tendo o Brasil passado por diversas configurações. Na nova República, que inicia com a promulgação da Constituição de 88, o governo de Fernando Collor (1990 -1992), por exemplo, foi o que menos ministérios teve, contando com 12 pastas no início e aumentando ao longo do mandato para 15. Já o mais robusto, nesse sentido, foi o governo de Dilma Rousseff, que em seu segundo mandato (2015) teve 39 ministérios. O número costuma refletir uma tentativa de acomodar perto do centro do poder os aliados do governo no Congresso.

Atualmente, Lula conta com 37 pastas, sendo 31 ministérios e outros seis órgãos com status de ministério. O atual presidente anunciou seus representantes enquanto garantiu que não haveria aumento de gastos com a criação de mais 15 departamentos em relação ao governo anterior, de Bolsonaro. Segundo Magna, o presidente tem a capacidade de remanejar, dentro dos cargos já existentes, a organização que ele desejar. Então a criação de mais ministérios não significa exatamente mais gastos, e sim uma dinâmica diferente dentro de uma estrutura que já existe.

Magna explica que as secretarias especiais são muitas vezes atribuídas ao espaço ministerial como forma de sinalizar que aquele tema é prioritário dentro do governo, como é o caso da  Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, comandada por Anielle Franco, e a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, com Aparecida Gonçalves á frente. “Em geral, o orçamento de uma secretaria especial está vinculado à presidência, ou seja, não conta com um orçamento próprio como os ministérios, e isso limita um pouco a atuação, mas as capacidades são as mesmas”, pontua. 

Orçamento e escolhas políticas

Quando Bolsonaro venceu as eleições, em 2018, um de seus anúncios foi a fusão do Ministério da Agricultura com o do Meio Ambiente, tendo como justificativa a intenção de enxugar a máquina pública e unificar interesses comuns. Ele acabou voltando atrás na decisão, devido à repercussão negativa, mas garantiu, na época, que quem assumiria o ministério do meio ambiente seria uma “pessoa voltada para a defesa do meio ambiente sem o caráter xiita como feito nos últimos governos”. Durante os quatro anos em que atuou, Ricardo Salles comandou a pasta a maior parte do tempo, tornando-se conhecido em 2020 por usar a expressão “passar a boiada” durante uma de suas reuniões ministeriais. A sugestão era que o Poder Executivo aproveitasse o momento das atenções da população e da imprensa voltadas para a pandemia de Covid-19 para alterar, sem a devida percepção da sociedade e análise da mídia, regras, decretos, normativas e leis ambientais que poderiam ser questionadas na Justiça. 

Para José Carlos Carvalho, engenheiro florestal e ex-ministro do meio ambiente do governo de Fernando Henrique Cardoso em 2002, mesmo sem tirar de cena o Ministério do Meio Ambiente, Bolsonaro cuidou de desestruturar todos os órgãos que o mantinham em pé. “Ele fez uma coisa ainda mais perversa, que foi matar as instituições fundamentais de inanição. Todas aquelas que fazem parte dos ministérios e lidam com a população mais vulnerável foram deixadas às traças:  Ibama, Instituto Chico Mendes e ICMBio foram esvaziados e esquecidos intencionalmente”, analisa. 

Ele aproveita para explicar a dinâmica ministerial, desde quando se estabelece a criação do departamento, quando é aprovada a Lei do Orçamento Anual. “É um momento decisivo, quando se definem as prioridades e como funcionarão esses órgãos operacionais (Ibama, IcmBio, ANA). Então cabe ao ministério e ao núcleo de suas secretarias formular as políticas e aos órgãos operacionais executar essas políticas”. Segundo o engenheiro florestal que acumula décadas de experiência em gestão pública, o tempo necessário para reverter a situação destes e outros órgãos esquecidos por Bolsonaro será grande.

Segundo Magna, a decisão de criar ou extinguir determinado ministério, durante um governo, pode tanto ser um movimento de fusão entre duas pastas com interesses afins, como pode sinalizar a desimportância de uma política específica para aquele governo. “Obviamente  a existência de certos ministérios  repercutem  na qualidade e no desempenho naquela área, e são decisões políticas que devem ser observadas com atenção por parte da sociedade civil”. 

Ao fazer uma análise da diferença do atual contexto histórico comparado com a época em que atuou como ministro, José Carlos relembra de como o desmatamento na Amazônia brasileira estava ganhando destaque há 20 anos atrás, provocando a regulamentação da Lei de Crimes Ambientais, criada no primeiro mandato do Fernando Henrique Cardoso. “O desmatamento estava começando a se deslocar para o Cerrado e começando a ganhar destaque internacional. Os problemas existiam, mas as administrações anteriores nunca negaram a existência dele, chegando ao ponto de dizer que se tratava de invenção de Organizações Não Governamentais, como fez o ex-presidente”. 

Meio Ambiente e Patrimônio nos ministérios

Como temas centrais do Observatório Lei.A, os assuntos relacionados ao Meio Ambiente e ao Patrimônio Cultural seguem tendo nossa atenção maior. Por isso, vamos destacar os ministérios relacionados a estes temas e suas respectivas competências, para que seja possível monitorar e acompanhar as decisões tomadas pelos respectivos  departamentos.

#aja

Saber quem são os atuais ministros é um bom começo para quem quer acompanhar de perto as decisões do governo em exercício. Separamos aqui algumas outras dicas que podem te ajudar a se envolver mais com o tema:

Acesse o portal da transparência O site é  mantido pela Controladoria-Geral da União por meio do qual é possível acompanhar a utilização dos recursos federais arrecadados com impostos no fornecimento de serviços públicos à população e se informar sobre outros assuntos relacionados à Administração Pública. 

Procure grupos que façam análises políticas confiáveis – Nas universidades, coletivos como o PEX Network, realiza diversas pesquisas sobre o tema. 

Escute podcasts e canais no Youtube de fontes confiáveis – Alguns programas trazem panoramas semanais sobre o tema, como o podcast Foro de Teresina, da Revista Piauí, o Café da Manhã, da Folha de São Paulo, e o Durma com Essa, do jornal Nexo.

Baixe aplicativos dos Governo – Há vários aplicativos do Governo com informações sobre ações dos ministérios ou acesso a serviços como o gov.br (portal geral do Governo Federal com informações e serviços), o conectsus, o compras.gov.br para acompanhar os processos de compras do governo entre outros. (https://www.gov.br/pt-br/apps?b_start:int=90)

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