“Nova cidade” prevê mais de 100 mil novos moradores na Lagoa dos Ingleses, população superior à maioria dos municípios mineiros, bem em cima da principal área de recarga da água que abastece a capital mineira
Por 10 votos a 2, integrantes do Conselho de Política Ambiental de Minas Gerais (Copam) concederam a primeira das três licenças necessárias para viabilizar o Complexo Residencial CSul

Imagem: Vinícius Carvalho (Lei.A)
Analise. A instalação de uma fábrica de refrigerantes tem sido apontada por ambientalistas como a causa da morte de nascentes que abasteciam duas comunidades próximas (Suzano e Campinho, município de Brumadinho). Nesta mesma região, faltam apenas dois passos para a instalação de um mega empreendimento que demandará estoque e reservas de água voltados a atender o consumo de água de 100 mil pessoas.
Se uma única fábrica de refrigerantes pode ser capaz disso, o que dizer então de uma nova “cidade” com capacidade para abrigar uma população gigantesca dessa?
E se nós lhe dissermos também que isso tudo está sendo feito exatamente sobre a principal região de recarga de água para abastecimento de Belo Horizonte e região metropolitana?
Você aceitaria correr o risco de que o futuro dos recursos hídricos da sua cidade seja comprometido sem maiores conhecimentos técnicos?
Estes são os principais questionamentos e alertas que ambientalistas fazem a respeito do complexo residencial CSul. Situado na Região Metropolitana de Belo Horizonte, o complexo prevê a ocupação de uma área de 27 milhões de metros quadrados na região da Lagoa dos Ingleses (no entroncamento entre as cidades de Nova Lima, Brumadinho e Itabirito) e tem demanda inicial de 2,3 milhões de metros cúbicos de água por mês.
O empreendimento recebeu nesta semana, a primeira das três licenças ambientais, necessárias para viabilizar a implantação do empreendimento: a chamada LP – Licença Prévia. Ainda será necessária a obtenção da LI – Licença de Instalação, que deve detalhar como se dará a implantação e consequentemente a captação de água, e na sequência, a concessão da LO – Licença de Operação, que autoriza a realização das obras e a venda das primeiras unidades habitacionais.
Procuradas por nós do Observatório Lei.A, as entidades ambientalistas contrárias ao empreendimento prometeram contestar a decisão. “O principal requisito da Licença Prévia, que é a viabilidade ambiental, não foi cumprido. Os estudos de viabilidade hídrica são preliminares e inconclusivos”, criticou Cleverson Vidigal, integrante da ONG Abrace a Serra.
O que está em jogo
Segundo ambientalistas e especialistas ouvidos pelo Lei.A, a existência das nascentes situadas na encosta oeste da Serra da Moeda dependem dos aquíferos, reservas de água subterrânea que serão exploradas pelo novo complexo residencial em questão. Essas nascentes alimentam hoje o rio Paraopeba, fonte de água para a população de Brumadinho e parte da Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Já no lado leste da Serra da Moeda, área que também poderia ser afetada, estão as nascentes que alimentam o Rio das Velhas. Esse manancial chega até Bela Fama, estação de tratamento da Copasa que responde por mais da metade da água que abastece hoje a capital mineira.

Imagem: Vinícius Carvalho (Lei.A)
Para o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, Marcus Vinicius Polignano, ainda faltam estudos mais consistentes para avaliar os impactos hídricos. Segundo ele, como está, o projeto coloca em risco o abastecimento de água de 4,5 milhões de pessoas.
“O Alto Velhas é hoje uma área de conflito. Não temos água. E em agosto e setembro, no auge da seca, vamos para uma vazão de 10 m3 por segundo, sendo que só Belo Horizonte já tira hoje 6,5 m3. E o futuro? 70% da nossa água vem da cabeceira da Serra da Moeda, o que quer dizer que não tem como pensar em qualquer empreendimento na região sem pensar nos impactos que isso vai trazer para todo mundo que depende dessa água”, alerta.
Estado não sabe o tamanho do impacto
A preocupação é reforçada por Julio Grilo, um dos fundadores do Movimento SOS Nova Lima e atual Superintendente do IBAMA em Minas Gerais. “Nós não sabemos hoje quais são os impactos acumulados pelos licenciamentos que já foram aprovados e outorgas que já foram concedidas sobre a área de captação da Copasa em Bela Fama, que responde por 67% do abastecimento de água de Belo Horizonte. Precisamos analisar o projeto considerando o impacto integral aos recursos hídricos e hoje essas informações não existem”, alegou.
Integrante da ONG Abrace a Serra, o geólogo Ronald Fleisher aponta também inconsistências nos estudos apresentados pela CSul. “Para chegar às reservas que eles precisam, apontam vários aquíferos, assumindo que eles estão interligados, o que sequer está comprovado. E aí está um problema grave: se você estima mal a reserva, a explotação* e o bombeamento terão de ser muito maiores do que o que está previsto hoje”, alertou.
* extração ou obtenção de recursos naturais
Outro lado
Segundo o coordenador de licenciamento ambiental da CSul, Waldir Salvador, a empresa vai investir R$ 9 milhões para fazer os estudos hídricos. Serão perfurados quatro poços profundos e oito piezômetros, equipamentos capazes de medir a quantidade e a qualidade da água no local.
Segundo ele, a medição será feita durante um ano para a conclusão dos estudos antes da possível outorga de uso do recurso hídrico. Ele alega também que a concessão da Licença Prévia não impede a continuidade da análise, uma vez que ainda não há consumo humano previsto nesta fase.
A implantação do projeto será feita de forma escalonada e a caberá à sociedade, se manter organizada, cobrando informações assertivas sobre uma avaliação ambiental integrada, que incluem estudos hidrológicos mais aprofundados, nesta região que é o vetor de crescimento prioritário da capital mineira.
Antes mesmo de ser implantado, o empreendimento já enfrenta conflitos pelo uso da água e precisa estar disposto e aberto a discutir com a sociedade em geral, por meio dos comitês de bacia, que precisam se tornar protagonistas no âmbito desta e de outras discussões similares.
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