Para finalizar os conteúdos da Série “As Nascentes do Rio das Velhas”, convidamos o fotógrafo Lucas de Godoy, morador da região, para contar sua relação afetiva com um dos lugares que protege as águas desse rio tão importante.
Minha ligação com o Parque Municipal das Andorinhas é ancestral. Meu bisavô, Jacinto, que era botânico, caminhava muito por aquela região em suas saídas e aulas de campo nos arredores de Ouro Preto. Nunca o conheci, mas estará sempre na minha memória uma foto dele com sua turma de alunos fazendo coletas e análises de plantas nas redondezas de onde hoje é o Parque.
Ali também temos a região conhecida como Camarinhas, que sempre foi considerada como “O Paraíso das Polipodiaceas” por outro importante botânico ouro-pretano, o José Badini. O caminho para o poço da Folhinha é cercado por estas plantas conhecidas genericamente como samambaias, remetendo-nos a um ambiente pré-histórico.
Das memórias que tenho de meu avô Vicente, que também era botânico e frequentador do local, me impressionava a história da queda de um pequeno avião perto da Cachoeira das Andorinhas. Muito tempo depois, moradores me contam que ainda se encontram vestígios da aeronave por lá. Meu pai também me disse lembrar desse dia em que o avião durante muito tempo sobrevoou Ouro Preto em busca de um local seguro para pouso até o trágico fim, nas Andorinhas.
Lembro, desde a infância, das caminhadas até a Cachoeira das Andorinhas com meus pais. Subíamos a Serra de Ouro Preto, passávamos para uma breve visita ao Frei Luís Sartori em seu mosteiro próximo à Capela de São João e rumávamos para a cachoeira. Nessa época, ficávamos apenas nas primeiras quedas d’água: a gruta da Cachoeira das Andorinhas era uma aventura apenas para os mais velhos, devido ao caminho perigoso até se chegar lá. E a Pedra do Jacaré, que paira no imaginário de todo ouro-pretano, só podia ser vista de longe. Dali, fitávamos aquela rocha recortada pelas serras de Minas ao fundo. Como me fascina aquela pedra!
Ficamos muitos anos sem ir às Andorinhas. O local ficou abandonado e era frequentemente associado a assaltos e furtos. Durante muito tempo quase ninguém ia para as bandas de lá.
Em um dos festivais de Inverno de Ouro Preto, no começo dos anos 2000, tive a oportunidade de fazer ali um pequeno curso de sobrevivência na Selva. Durante três dias ficamos no parque aprendendo sobre os diversos tipos de “nós”, primeiros socorros e técnicas de Rapel. Foi emocionante passar ali aquelas tardes de inverno.
Com a efetivação do Parque, toda a população abraçou novamente aquele espaço tão importante para a cidade, para as origens de Minas. Afinal, ali nasce o Rio das Velhas, ainda que sua principal nascente fique fora dos limites legais do Parque.
A visita ao Parque Municipal das Andorinhas é obrigatória para os turistas amantes da Natureza. Situado a 20 minutos da Praça Tiradentes, no espaço você encontra trilhas de diversos níveis, sendo possível aproveitar o local mesmo para os que não gostam de longas caminhadas.
Você sabia que o Parque Municipal das Andorinhas foi criado para proteger as principais nascentes do Rio das Velhas? Confira: http://leia.org.br/serie-especial-lei-a-as-nascentes-do-rio-das-velhas-monitore/
Dali, avista-se a Serra do Caraça e o Pico do Sol, que é o ponto mais alto da Serra do Espinhaço. De cima de uma das rochas podem ser vistas também, num fim de tarde, as franjas do Caraça e a Serra de Capanema. Nas proximidades, no alto do Morro de São João, descansa o “moinho de vento”, marco do antigo arraial do Ouro Podre, que tanto conta da história de Minas Gerais.
Nos últimos anos fui descobrindo outros lugares do Parque, como o poço da “Folhinha”, um verdadeiro oásis no meio da mata. Recentemente outras atrações tiveram o acesso liberado ao público: a “Cachoeira dos Pelados” e a do “Véu das Noivas”.
Na primeira, em uma ida com um grupo de amigos de Curitiba, fiz uma imagem do pai carregando o filho ao lado da queda d’água. Eles eram visitantes do Rio de Janeiro e aquela cena me remeteu ao que acredito sobre a importância dos parques e reservas florestais: além da preservação da paisagem, da água, da fauna e flora, os parques devem ser um ponto de encontro entre comunidade-natureza. Um lugar que nos conduza a essência mais bela e ancestral da humanidade.
Infelizmente, apesar da total entrega e conhecimento do lugar da atual gestão, o parque não recebe o devido suporte necessário para a sua manutenção. São poucos os guarda-parques e a conservação do local acontece com muita batalha dos que lá trabalham.
Fotógrafo, videomaker e morador de Ouro Preto. Trabalha com documentação de paisagens, pessoas e histórias. Idealizador e coordenador do Festival Fotógrafos em Ouro Preto. Dirigiu os curtas-metragens “Branquinha”, “Por quem os sinos dobram” e “O céu para o Condor”. Foi colaborador do Jornal A Sirene, produzido pelos atingidos do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana.